– Adriel! – Acordei gritando seu nome, quente e agitada.

Sonhei com ele, mas foi confuso e lembrava-me mais da sensação. Uma esperança louca esgueirou-se por entre a faca e instalou-se ali dentro.

– “Ele vive!” – Pensei, sentindo as batidas endoidecidas de meu coração e envolvida naquela certeza, quis sair correndo à sua procura.

– O que foi, menina? Ouvi você gritar. Teve pesadelo? – Era Tana que entrava ainda com roupa de dormir.

– Tana, ele está vivo! Sonhei com ele, pela primeira vez! Está vivo!!! Ó meu Deus, obrigada! – Juntei minhas mãos em um gesto de prece e agradecimento.

– Como assim? O que sonhou? O que ele disse? Onde está?

– Não sei, Tana. Não lembro o que sonhei. Apenas sei que foi com ele e acordei chamando-o e com esta certeza de que vive.

– Menina… Sei que não se conforma e é bom que sonhe com ele, mas não se iluda. Vai sofrer mais.

– Eu sinto, Tana. Dentro de mim. Não é uma ilusão. Adriel vive em algum lugar.

– Bem, se estiver vivo virá a Etera, não é? Então vamos aguardar. – Ela disse com jeito de quem não acreditava realmente.

– Sim, vamos aguardar. Ele virá. – Não importava que não acreditasse. Meu Adriel vivia. Era o que meu coração dizia e aguardaria até que viesse.

– Vou trazer seu café da manhã.

– Tana, hoje é o dia da festa e da coroação, mas é só à tarde. Estou pensando em ter a manhã livre, para passear um pouco. Acha que posso?

– Humm… Tem certeza de que está bem? – Olhou-me com olhos críticos procurando sinais preocupantes.

– Estou sim. É só que quero ficar um pouco quieta, pensando, livre destas atividades.

– Tudo bem, mocinha. Vá e entendo-me com Elros.

– Obrigada, Tana!!! – Dei-lhe beijos estalados nas bochechas, vesti-me e tomei rapidamente o café da manhã.

Nos fundos do palácio estava Aza à minha espera e também Niis, meu doce amiguinho, que afastei de minha presença naquele primeiro mês e que agora não deixava-me mais.

Aza era um pégasus. Pertencera à minha avó e puxava sua carruagem pelos céus quando ela não queria ir voando. Agora era bem útil porque ainda não tinha asas e as distancias não eram tão pequenas assim. Elros levava-me algumas vezes, mas eu não gostava de voar em seus braços. Era íntimo demais e recordava-me de Adriel. Ele pareceu perceber e um dia levou-me até Aza.

Era um cavalo completamente branco e com asas imensas e um símbolo da imortalidade.

Eles não envelheciam ou morriam, nunca. Pelo que entendi, era também um ser Elemental, embora de nível diferenciado. Falava pouco, mas tinha personalidade. Disseram-me que ele escolhia um dono e não o contrário e que estava ali de livre vontade, porque adorava minha avó e quando ela morreu, disse que ficaria para ser útil à futura rainha, mas não deixou ninguém mais montar nele.

Parecia conhecer-me, já. Na primeira vez que o vi, fiquei com um pouco de receio porque era muito grande. Ele fez uma reverência muito delicada com as pernas dianteiras e as patas e piscou um dos olhos de forma engraçada.

– Aproxime-se, jovem rainha. Estava a sua espera.

– Você fala? – Perguntei e ele apenas revirou os olhos, como se fosse uma imbecil. É lógico que era, ele acabara de falar, pensei sorrindo e todo o receio acabou.

Passei a mão por seu pelo macio, pelas suas asas tão incrivelmente brancas e depois em sua cabeça. Ele olhou-me firmemente nos olhos e senti que tinha ganhado um amigo muito fiel.

Niis pegou para si a tarefa de cuidar de Aza e passavam os dias juntos.

– Maise! Acordou cedo. Vamos passear? – Ele perguntou com um sorriso imenso, pois adorava todas as vezes que saíamos juntos.

– Bom dia, Niis querido. Bom dia, Aza. Sim. Quero ir ao pequeno lago esta manhã, para descansar antes da coroação. Vamos?

Subi em Aza, com Niis sentado à minha frente. Embora ele pudesse teletransportar-se rapidamente, tinha receio de que caísse e se machucasse antes de conseguir ir para um local seguro.

Aza voava magistralmente e era como se deslizássemos através do vento. Sentia apenas o ar acariciando-me com suavidade e naquele momento fechei os olhos e deixei-me levar pela sensação agradável de flutuar no ar.

Pousamos na beira do pequeno lago, como o chamávamos para diferenciar do grande lago que contornava o castelo. Este era realmente um recanto mágico e rapidamente tornou-se meu predileto.

De uma encosta descia uma pequena cascata que desaguava em uma área circular, pequena e não muito funda, com fundo de pedrinhas lisas e coloridas. A água era de um azul meio turquesa, incrivelmente transparente e que brilhava de forma agradável e não ofuscante.

Ao redor do lago, de um lado um vasto campo de flores do campo, coloridas e muito cheirosas e de outro uma relva macia, de um verde intenso, com algumas árvores e ao fundo o início da floresta.

Tirei o vestido, ficando apenas com o maiô e entrei na água, desesperada por sentir sua tepidez e a sensação gostosa de ser envolvida por elas. Niis e Aza também entraram. Os dois adoravam este lugar tanto quanto eu e ficaram envolvidos em brincadeiras enquanto eu apenas boiava, com os olhos fechados, deixando que a paz daquele momento me envolvesse.

Hoje eu podia sentir isto integralmente. Adriel estava vivo. Não precisava mais culpar-me ou privar-me de qualquer prazer. Saboreei lentamente aquela sensação de prazer, a primeira desde que vim para Etera.

Mais tarde, deitei aos pés de Sally, um salgueiro imenso junto à relva. Ela também falava, tinha descoberto em uma ocasião, mas era mais raro e apenas quando havia necessidade. Era uma árvore antiga e diziam que muito sábia, embora um pouco ranzinza. Suas folhas e galhos eram utilizados pelas fadas, para feitiços de purificação, de cura e para o feitio de varinhas mágicas.

Deixei-me ficar sob a proteção de sua imensa copa e cochilei por alguns minutos, enquanto Aza e Niis saiam em busca das frutas comestíveis que haviam por ali e que gostavam.

Foi um sono confuso, em que flutuava em um vazio branco. Sally apareceu e disse:

– Tenha fé, doce Maise. Cuida de ti, mas mantenha-o vivo em seu coração, para que não deixem de chamar-se e reencontrem-se através desta voz. Lembre-se: tenha fé.

Acordei com Niis que trouxera-me uma guirlanda de flores, bonita, colorida e perfumada.

Olhei para Sally de esguelha e agradeci mentalmente pelo conselho.

– Niis, que lindo! Obrigada querido.

– Fiz para que use na festa. Vai usar, Maise?

– É lógico que vou. Ficará muito bonito com meu vestido todo branco e prata. Agora é hora de voltar.

Era tarde já. Dali a pouco a cerimônia teria início e Tana devia estar descabelando-se toda com minha demora.

Sorri ao pensamento, admirando-me com a facilidade com que voltava à minha face.

Hoje estava feliz e em paz. Adriel vivia. Não sabia onde ou como, nem quando nos reencontraríamos, apenas tinha a certeza de que aconteceria um dia. Até lá eu seguiria em Etera, fazendo o melhor para meus pequenos amigos e preparando tudo para o dia em que ele voltasse.

Adriel… Deixei seu nome envolver-me inteira, estupidamente feliz.

Texto registrado no Literar.

Informações sobre os poderes dos salgueiros obtidas aqui.

Imagem de Aza daqui.

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