Quando os jogos deram aquele passo especial.


Num cenário de completa desolação no qual podíamos ver um infindável número de armas, entre elas em destaque uma que facilmente se reconhecia como a do personagem principal que vimos nos vídeos promocionais, banhado pelos tons alaranjados de uma tarde ao por do sol, Final Fantasy X começava por nos mostrar um desconhecido grupo de personagens sobre o qual nada sabíamos. Perante o olhar atento de uma jovem, o protagonista levanta-se e caminha por uma colina acima para ter melhor perspetiva sobre todo o cenário.


Nem Lightning conseguiu fazer-nos esquecer Yuna.

Com uma inspirada e fascinante perspetiva sobre o desolado cenário temos o surgir das letras Final Fantasy X. Esta sequência introdutória a um dos mais fascinantes produtos lançados na PlayStation 2 serviu desde logo para mostrar como este novo jogo estava acima e diferente dos anteriores em termos de níveis de produção e ambição.


Em muitos aspetos FFX deu-nos várias estreias: Yoshinori Kitase assumiu o cargo de produtor ao lado de Hironobu Sakaguchi como produtor executivo, Nobuo Uemtasu não foi o único responsável pela banda sonora, o sistema clássico Active Time Battle dos combates deu lugar a um dinâmico Conditional Turn-Based Battle, o esquema clássico de progressão automática e subida de níveis foi largado em prol da Sphere Grid. Os cenários clássicos pré-renderizados deram lugar a ambientes complemente em três dimensões, e pela primeira vez tivemos vozes nas personagens. Estas são algumas das maiores novidades e são provavelmente alguns dos elementos que mais destacam e marcaram Final Fantasy X na altura do seu lançamento em Maio de 2002.



Nascido de um espantoso grupo de mentes que na altura gozava de conceito sem igual, Final Fantasy X foi alvo de todo um fervoroso desejo em explorar uma máquina que estava a dar os primeiros passos. A PlayStation 2 havia sido lançada em Novembro de 2000 na Europa e este foi um dos chamados jogos de segunda fase que deu um impulso e personalidade singular à máquina, permitindo que obtivesse um apelo difícil de equiparar entre a comunidade adepta de videojogos.



Depois da introdução cativante que referi no primeiro parágrafo, o jogador passava para um mundo de tons futuristas que viria a conhecer como Zanarkand. Neste luxuoso cenário iria conhecer o jovem loiro como Tidus, um personagem imaturo que iria crescer enquanto explorava o mundo em proporção ao crescimento do jogador. Tal como o seu pai, Tidus é um herói de um interessante desporto conhecido como Blitzball e na sua caminhada para o estádio, o jogador ia tendo o primeiro contacto com a implementação de vozes na série. 


 

Enquanto o jogador controlava Tidus, o narrador ia falando do seu fascínio por Jecht, pai do protagonista, e sobre o seu desaparecimento 10 anos atrás.



Ao chegar ao estádio o jogador conhecia a primeira e verdadeiramente luxuosa FMV de Final Fantasy X. Uma das marcas da Square que impressionava ainda mais a cada novo jogo. Ao som de uma música verdadeiramente incaracterística da série, um rock pesado, o jogador via Tidus a jogar o seu desporto aclamado enquanto algo de estranho decorria no mar debaixo do olho de um misterioso personagem de vermelho. Uma enorme bolha de água começou a destruir Zanarkand e parou o jogo fazendo com que a multidão corresse para se salvar. Ao encontrar o homem misterioso que Tidus conhece como Auron, este explica que “chamávamos-lhe Sin” e pouco depois temos o nosso primeiro contacto com o sistema de combate.


“Final Fantasy X não se impunha sobre o jogador, ia crescendo na sua complexidade narrativa e nas suas mecânicas de jogo.”




Um ecrã que se desfoca por breves momentos foi a força que a Square encontrou de contornar algumas limitações técnicas na altura para oferecer o melhor possível uma transição entre exploração e combate sem interrupções. O efeito espantou na altura, ainda hoje espanta, pois são mesmo breves instantes nos quais o jogador perde o controlo do jogo. Aqui também tivemos o primeiro contacto com os Overdrives, ataques especiais que ficavam acessíveis quando o jogador sofria determinado nível de dano e a respectiva barra ficava preenchida. Mas isto eram apenas os primeiros passos e as bases de um sistema de combate fascinante, envolvente, dinâmico e que se sentia verdadeiramente como algo fresco e inovador.




“É agora. Esta é a tua história. Começa tudo aqui,” diz Auron enquanto Sin destrói Zanarkand e o próprio Tidus para ser sugado pelo monstro. Estes foram os primeiros momentos do que se viria a revelar como um dos mais importantes capítulos na série Final Fantasy e a partir daqui o jogador ia entrar num mundo que viria a conhecer como Spira, no qual iria conhecer personagens como a Al Bhed Rikku, o jogador de Blitzball Wakka, a jovem Yuna juntamente com os seus guardiães Lulu e Kimahri, e claro Auron. Este mundo de Spira conseguiu exercer um incrível fascínio e capacidade de imersão não só pelo sua nova e brilhante renderização totalmente a três dimensões mas também pela imensa variedade de cenários que oferecia. A nova perspectiva da câmara, dinâmica a seguir o jogador mas na sua maioria colocada nas costas do personagem, permitia um olhar incrível sobre este mundo e era fácil o jogador se deixar apaixonar.

Final Fantasy X não se impunha sobre o jogador, a equipa de desenvolvimento preferiu que o jogo fosse crescendo na sua complexidade narrativa e nas suas mecânicas de jogo a um ritmo que o jogador podia acompanhar e o próprio crescer, sendo exemplo disso o seu conhecimento do mundo e do tamanho que ia crescendo, o sistema de combates e a melhoria de personagens.
Na narrativa, misteriosa e até confusa no início, o jogador ia a passo e passo conhecendo o mundo de Spira, os seus diversos povos e formas de estar neste mundo ameaçado por uma monstruosa criatura que a qualquer momento podia destruir toda a civilização, como já tinha feito milhares de anos antes. Se no passado Sakaguchi tinha apostado seriamente no relacionamento amoroso entre personagens e no espírito da camaradagem entre amigos improváveis para triunfar perante ameaças maiores que o mundo, aqui em FFX o mesmo é impresso mas com uma dose mais imponente. Pessoas que se dedicam a peregrinações para conquistar poderosas criaturas, conhecidas como Aeons que representam os míticos Summons da série, para vencer Sin e como consequência morrerem, fizeram com que os relacionamentos e a forma de perceber o mundo em X fosse muito mais madura e poderosa, com o jogador sempre expectante quanto ao relacionamento amoroso entre Tidus e a jovem Yuna, com formas bem diferentes de ver o mundo.
O espírito irresponsável de Tidus, jovem mimado e despreocupado, que conhecemos no início do jogo contrasta com o homem responsável e decidido que conhecemos no final do jogo. Isto é apenas um exemplo do desenvolvimento de personagens que temos no jogo e um dos maiores trunfos do jogo é como tão facilmente o jogador vai seguindo os personagens e se apercebe do seu amadurecimento. Num mundo embrenhado no desespero, vamos conhecer diferentes fações com objetivos próprios e vamos conhecer um conflito bem mais abrangente do que inicialmente pensado. O jogo está repleto de momentos memoráveis e desde a chegada pela primeira vez a Luca para o torneio de Blitzball ou a cena na qual a equipa investe pelos céus no casamento forçado de Yuna com o malvado Seymour certamente ficaram na mente dos seus fãs.
Em termos de combate o jogo marcou pela forma dinâmica com que atualizou o esquema clássico. Combates mais rápidos, nos quais o jogador podia alternar em tempo real entre membros da equipa, continham tamanhas camadas de profundidade que apesar do alto ritmo a que tudo acontecia o jogador não deixava de ser desafiado e motivado pelo jogo. Com um grupo tão diversificado de personagens, cada uma tinha os seus pontos fortes e fracos sendo necessário ao jogador criar uma equipa com a qual se identificasse, tendo sempre presente na ideia os restantes pois a qualquer momento podiam ser chamados. Mais do que entrar nas profundezas de sistema tão profundo e interessante, queremos aqui destacar que foi dos maiores prazeres que tive com esta série, foi verdadeiramente fascinante e os combates decorriam com tal interesse que o “grinding” fazia com que horas parecessem minutos.
“Com o sistema de esferas o jogador podia delinear qual a linha da grelha que queria seguir e tudo ia-se tornando mais fácil e viciante”
O resultado desses combates eram os pontos de habilidade que o jogador recebia, substituindo a tradicional experiência. Esses pontos podiam ser usados na Sphere Grid, grelha de esferas autenticamente, e permitiam uma forma mais personalizada de desenvolver o personagem. Se o jogador podia adquirir novas esferas de habilidade, ao invés de algo forçado e pré-determinado, o jogador podia escolher se queria mais vitalidade ou mais força nos ataques físicos, por exemplo, mediante as suas opções de progressão nas várias ramificações desta grelha. Respeitando as inerentes classes de cada personagem, Yuna era uma White Mage enquanto Auron era um guerreiro, por exemplo, o jogador tinha ainda assim liberdade para a dado momento começar a conferir ao forte guerreiro habilidades de cura.

Este sistema de progressão revelou-se um autêntico vício e quase uma sensação pokemon, mais uma esfera, só mais uma, e tenho que tentar ter todas desta classe deste personagem. Foi toda uma nova dimensão para o tradicional melhorar de nível dos anteriores que nos faziam perder horas na procura que o personagem tivesse as desejadas melhorias para bater aquele boss específico. Final Fantasy X teve bastantes desses bosses, alguns míticos (quem não se lembra dos Dark Aeons por exemplo, ou dos Aeons não obrigatórios que podíamos procurar e obter como Yojimbo e as Magus Sisters). Com os sistema de esferas o jogador podia calcular os pontos necessários e delinear qual a linha da grelha que queria seguir e tudo isto não se tornava confuso ou incomodo, pelo contrário, ia-se tornando mais fácil e viciante.

O fascínio que me causou não fez só com que fosse o jogo que me acompanhou nesse Verão, foi de tal forma gigantesco que foi este jogo que me acompanhou no regresso às aulas, que me acompanhou no Natal e que me acompanhou no Verão seguinte. Se cada novo jogo é toda uma porta para um incrível fascínio,

Final Fantasy X foi verdadeiramente singular e apesar de dever a FFVII todo o fascínio que tenho por esta indústria, sem este décimo capítulo provavelmente não estaria ainda hoje tão forte. O seu sucesso foi tal que até foi o primeiro jogo numerado na série a ter direito a sequencia direta, na forma de Final Fantas X-2, o chamado Pink Final Fantasy, que fica para mais tarde recordar.

Atualmente continuamos à espera de mais notícias sobre Final Fantasy X HD que está a caminho do PlayStation 3 e PlayStation Vita e confesso que é um dos jogos que mais desejo jogar, bem acima de qualquer remake de Final Fantasy VII que prefiro deixar preservado nas minhas memórias tal como está e como era.

Poder jogar uma versão atualizada deste décimo capítulo em alta definição é um louvor que peço que seja feito rapidamente e uma devida e mais do que justa homenagem a este poderoso capítulo que quebrou tantas barreiras no género e se mantém ainda hoje, passados mais de 10 anos singular.





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